Política Lava-Jato

Trecho mais grave do áudio é susposto crime de ex-procurador, avaliam integrantes da PGR

Janot abriu investigação sobre gravação de dois delatores da JBS
O ex-procurador Marcello Miller Foto: Divulgação / MP-MG
O ex-procurador Marcello Miller Foto: Divulgação / MP-MG

BRASÍLIA - O trecho de maior gravidade na gravação de quatro horas entre os delatores Joesley Batista e Ricardo Saud é o que trata da atuação do então procurador da República Marcelo Miller a favor do grupo J&F, enquanto ainda integrava o grupo de trabalho da Lava-Jato dentro da Procuradoria Geral da República (PGR). Esta é a interpretação de integrantes do grupo de trabalho que ouviram a gravação. ( PEDIDO DE INVESTIGAÇÃO : Leia a íntegra da decisão de Janot )

As citações ao Supremo Tribunal Federal (STF) e à própria PGR seriam, segundo essas fontes da PGR ouvidas pelo GLOBO, uma espécie de "bravata", na linha do que fez o senador Romero Jucá (PMDB-RR) quando gravado pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado. Jucá, na ocasião, disse ser necessário um pacto nacional para barrar a Lava-Jato, "com o Supremo, com tudo".

A gravação que pode levar à anulação do acordo de delação assinado pelos executivos da JBS teria ocorrido em 17 de março. Naquele momento, Miller ainda integrava o grupo de trabalho da Lava-Jato. Nesta segunda-feira, o procurador-geral da República anunciou que abriu investigação sobre a negociação do acordo com a JBS .

Joesley e Saud dizem, como captado no áudio, que contavam com o auxílio do procurador que estava lotado no gabinete de Janot. "Em alguns trechos, Ricardo Saud afirma que já estaria 'ajeitando' a situação do grupo empresarial J&F com o então procurador da República Marcelo Miller, bem como que Marcelo Miller estaria 'afinado' com eles", cita o despacho do procurador-geral que determinou a abertura de um procedimento interno para revisar os benefícios concedidos na delação premiada. Miller só foi exonerado do cargo de procurador da República, para atuar na advocacia e para o grupo proprietário da JBS, em 05 de abril.

Segundo fontes da PGR que tiveram acesso à gravação, não há citações explícitas a ministros do STF ou a integrantes da PGR, mas sim "bravatas" em relação às duas instituições. O risco de que os delatores percam os benefícios está diretamente relacionado ao que eles vão dizer em depoimento dentro do processo de revisão aberto, conforme essas fontes. Joesley, Saud e o advogado Francisco de Assis e Silva têm de se explicar até o próximo dia 8. Janot submeteu ao STF a deliberação sobre o sigilo da gravação, que contém trechos sobre a vida pessoal de alguns citados.

Procuradores que atuam na Lava-Jato dentro da PGR dizem que uma investigação sobre a atuação de Miller não caberia ao órgão, uma vez que ele não tem foro privilegiado. Assim, uma apuração de suposta prática criminosa por parte do ex-procurador ficaria a cargo do Ministério Público Federal em primeira instância.

Os delatores, segundo fontes da PGR, vinham entregando complementação de provas ao longo dos 120 dias do prazo dado dentro do acordo. Na noite da última quinta-feira, último dia dia do prazo, os advogados entregam áudios com gravações ainda inéditas. A conversa de quatro horas apareceu no terceiro áudio ouvido pela equipe de Janot, referente a um parlamentar. O áudio tinha o nome "PIAUI RICARDO 3 17032017.WAV", como consta no despacho assinado por Janot.